domingo, 5 de setembro de 2021

Recordações santistas - Boris Dahis

Cartão Postal de Santos
arquivo pessoal da autora do Blog

Recebi o texto abaixo de sr. Boris Dahis sobre Santos, comunidade judaica e recordações santistas, e aqui compartilho: 

Vivi durante 15 anos na Baixada Santista, 05 dos quais dedicados à coletividade. Após minha aposentadoria lecionei a língua hebraica, e preparei alunos para o Bar Mitzvá. Não só ensinava a língua como pregava o amor à Israel, onde vivi por 22 anos. 

Tenho ex-alunos em Israel com os quais ainda mantenho contato e me sinto recompensado. 

Lembro-me com imensa saudade do Sr. Izaak Alperovitch Z”L, a quem o ishuv santista tanto deve, deveria lembrá-lo e homenagear a sua lembrança. Homem integro, bondoso, culto, com vasto conhecimento bíblico que conjuntamente com o Sr. Eli Elnekave dirigiam as cerimônias religiosas na sinagoga. Como não havia minian na sinagoga sefaradita Beit Zion e na ashkenazita Beit Yakov, juntaram-se as duas coletividades na Beit Yakov, e metade das rezas de shabat eram realizadas pelo Sr. Alperovitch (ashkenazita) e metade realizadas pelo Sr. Eli (sefaradita). O atual presidente da sinagoga Beit Yakov Jacques Zonis e seu atual chazan Beto Barzilay fazem hercúleos esforços para evitar seu fechamento.

Quanto ao CCIB (Centro Cultural Israelita Brasileiro) fiz parte de sua diretoria como diretor cultural. A diretoria era atuante assim como o clube. Ali festejávamos as festas judaicas com público numeroso. Ponto curioso e interessante era nossa barraca de praia no canal 5.

Fundado nos anos de 1940, formaram uma rica biblioteca de livros escritos em idish. Estava numa situação lamentável, abandonada que fora, uma parte comida pelas traças. A língua idish servira os judeus ashkenazitas por 1000 anos, e eu mesmo não sabia que havia uma literatura tão vasta. A biblioteca continha dicionários, enciclopédias, poesias, biografias, história judaica, contos e muita literatura comunista: Marx, Engels etc. Livros editados antes da 2ª. Guerra mundial na Polônia passando depois para os Estados Unidos e Argentina, jornais e revistas. Parte estava catalogada, parte não. Cataloguei a parte restante. Escrevi para os EUA e tentei doá-la. Recusaram. Numa visita à Israel entrei em contato com uma Associação de Amantes da Língua Idish. Recusaram. No final encaixotaram e remeteram para São Paulo. Deve estar em algum porão da Unibes. Uma pena. Eu tive que mudar para São Paulo minha cidade natal, por problemas de saúde. O Sr. Alperovitch faleceu, o Sr. Eli afastou-se. Outros retornaram à São Paulo. Iniciou-se então a derrocada.

Recordações santistas – Boris Dahis

Anos 1990 – Retornei à Santos. Após minha aposentadoria, e fechamento de minha firma resolvi dedicar-me mais à coletividade judaica. Ao mesmo tempo senti que estava esquecendo a língua hebraica, língua que sempre amei e estudei em meus 22 anos em Israel. Em Santos havia um professor de hebraico, ex companheiro meu de kibutz, que lecionava e preparava alunos para Bar Mitzvá resolvera, porém, se mudar para os EUA. Resolvi substituí-lo.

Naquela época não existiam no Brasil, livros de estudo de Hebraico. Eu trouxera alguns, mas todos na língua Hebraica. Resolvi então lecionar, e escrever um livro didático baseado em métodos israelenses escrito em Hebraico, mas traduzido em português que me ajudasse nas lições. Vieram depois mais 02 livros: um de gramática outro de 200 verbos hebraicos conjugados. Fruto de 15 anos de trabalho, eles estão à venda na Livraria Sefer. Nestas aulas conheci diversas pessoas judias ou não: padres, pastores, emigrantes para Israel, crianças prestes a fazer o Bar- Mitzvá, etc. Dividi meu tempo entre minhas aulas particulares, a sinagoga Beit Yakov e o CCIB (Centro Cultural Israelita Brasilie iro) no qual fiz parte da diretoria como diretor cultural. Sobre este período vou lhes relatar. Nada é fictício, tudo verdadeiro.

Tenente Coronel Robson veio a mim para aulas de Hebraico, movido pela admiração que tinha pela força aérea israelense. Após a Guerra dos Seis Dias, os pilotos israelenses e seus aviões franceses Mirage ficaram conhecidos no mundo todo. Robson era piloto de guerra. Pilotava aviões de caça e helicópteros. Formara-se na escola da base aérea de Pirassununga, estudara engenharia e mais tarde medicina. Criou-se no interior de São Paulo, era extremamente inteligente e modesto. Estava sediado na Base Aérea de Santos, na cidade de Vicente de Carvalho próximo ao Guarujá.

Sabia que eu também fora militar, paraquedista nas IDF e entre nós criou-se uma identidade e uma amizade de irmãos. Como diretor cultural do CCIB eu criara um pequeno boletim com o nome de Lapid (tocha) no qual eu relatava notícias do Clube e da comunidade judaica de Santos. Robson aproveitou então e conseguiu-me uma tarjeta de jornalista com a qual eu entrava livremente na Base Aérea. Graças à D´us no Brasil não há guerra. Os pilotos raramente pilotavam aviões. Resumiam-se mais às aulas teóricas e festas. E que festas!!! Festa alemã, francesa, americana, etc. Tudo era motivo para uma festa. Shows, danças, bebidas e muita comida principalmente tainha recheada na brasa especialidade de toda a Baixada Santista. E eu participava de todas elas como convidado “jornalista”.

A Base Aérea era um lugar agradável. Casinhas térreas e chalés de teto vermelho cercado de grama e de jardins, possuía tudo que uma família necessitava fora e dentro de suas casas. Nelas viviam os pilotos que junto aos seus familiares, estavam sempre de prontidão. Ficava à beira do rio Cubatão numa paisagem pastoral, porém infelizmente beira-rio fazia que o local fosse infestado de borrachudos aos quais eu sou alérgico. Frente à casa de Robson sobre o rio havia uma ponte pênsil miniatura da ponte de Londres, que sobre ela passava o trem que fazia ligação entre Santos e o Guarujá e que era levantada cada vez que um barco necessitasse passar. A locomotiva deste trem está exposta numa praça do Guarujá. Lembrei-me de meu pai que me levava neste mesmo trem.

Naquele ano visitei Israel e as minhas 02 filhas e meus cinco netos que ali residem. Robson pediu-me que eu lhe trouxesse o máximo de literatura ligada à aviação israelense, um boné (vermelho) e asa de paraquedista. Queria guardá-las como lembrança minha. Tenho comigo como lembrança inseparável meu boné, asa, a tarjeta de meu batalhão que levava ao ombro e uma medalha da Guerra de Yom Ha’kipurim e não podia dar-lhe. Numa visita à minha cunhada na cidade de Beer Sheva lá existe uma base da Aeronáutica de Hatzerim e um grande museu da Aeronáutica. Tirei muitas fotos e comprei-lhe um livro que relatava os aviões, os pilotos e as façanhas da F orça Aérea Israelense. De um amigo cujo filho servia nas IDF pedi-lhe que comprasse no shekem (cantina do exército) uma boina e asas de paraquedista e presenteei-o. Soube que estava terminando o curso de medicina. Há anos que não o vejo, mas ele permanece em minha lembrança. Sempre fui muito ligado aos meus alunos e às suas histórias.

Aproximavam-se as comemorações do Yom Ha’Hatzmaut. A diretoria do CCIB resolveu comemorar o Dia da Independência de Israel com uma grande celebração. Resolvi complementá-la com algo inédito, e recorri ao meu amigo Ten. Cel. Robson. Pedi-lhe a participação da Banda da Base Aérea, que era conhecidíssima e famosa em Santos, e que tocasse os hinos do Brasil e Israel e músicas israelenses. Pediu-me as partituras. Parte consegui-as pela Internet e parte através de meu primo Boris Blinder Z”L, então diretor do Colégio Israelita I.L. Peretz. O Clube lotou de pessoas, muita alegria e emoção. A Banda veio, tocou com perfeição como sempre, as músicas israelenses e o público os ovacionou.

Mais uma que fiquei devendo ao meu amigo Robson e ao meu primo Boris Blinder Z”L.

2 comentários:

  1. O nome correto do Chazan é Ely El Gadeh,e até hoje é chazan na comunidade com a idade de 83 anos.

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