quarta-feira, 21 de março de 2018

Uma roda de conversa na "Sinagoga dos Húngaros"


No encontro de domingo, dia 18/03/2018, na Sinagoga Israelita Paulista participamos de uma roda de conversa. 

Alan Kovari, filho do sr. Tomaz (presidente desta sinagoga), iniciou o encontro  informando aos presentes que "esta sinagoga funciona todo Rosh Hashaná e Yom Kipur, e uma vez ao mês, no último Shabat do mês, acontece um Cabalat Shabat e Shacharit Shabat, com kidush e almoço". Alan contou que o sr. Tomaz, imigrante da Hungria, quando assumiu a presidência, comprometeu-se em mantê-la funcionando, como uma missão de vida, mesmo que fosse difícil manter os frequentadores, colaboradores e conseguir um “minian”. Quando o sr. Tomaz chegou com a família ao Brasil, um pouco antes da década de 1960, estava com 5 anos. A sinagoga foi muito acolhedora para a família, o pai de sr. Tomaz, sr. Arpat, podia sentia-se bem, por poder se encontrar com os imigrantes húngaros. Na presidência, o pai de Alan providenciou a tradução da Atas da sinagoga para o português, realizada por sr. Gabór Aranyi e digitalizou-as, inclusive, como forma de perpetuá-las e preservá-las. Até 1965 tais Atas eram escritas em húngaro. Sr. Tomaz possui também as plantas. Comentei com todos participantes do encontro que Roberto Strauss, também presente neste encontro, havia me enviado o desenho do Aron Hakodesh, doado pelo tio-avô, Paulo Strausz.

Roberta Sundfeld, historiadora, apresentou-se e contou que teve a oportunidade de entrevistar, na década de 1980, o sr. Luiz Nebel, um dos presidentes e fundadores desta sinagoga. Sr. Luiz havia informado, e apresentado documentos, comprovando que esta sinagoga foi fundada em 1924, por judeus húngaros. Roberta lembrou que sempre se considera o BethEl como a primeira sinagoga dos bairros fora do Bom Retiro, porém comentou que tal informação não procede, pois o BethEl é de 1928/29. Assim, Roberta sugere, deveria haver um estudo para saber quem são os húngaros que chegaram na década de 1920 e instituíram tal sinagoga fora do Brás/Bom Retiro. Neste sentido, eu comentei detalhes já estudados, pesquisados e divulgados aqui neste Blog, e no Facebook, quanto às questões apresentadas, como locais aonde situaram-se e quanto aos três períodos da imigração desta comunidade.

Apresentei, a todos que vieram nesta visita, detalhes de minha pesquisa sobre "As Sinagogas em São Paulo". Rachel Mizrahi enfatizou que através da história e origem das sinagogas é possível resgatar o histórico dos fundadores.

Sra. Suzana Yara Guttman falou que duas épocas foram marcantes: “uma antes da Revolução, antes de 1957, na sinagoga da Rua General Osório, que remete à minha infância. Minha irmã, Marion, sete anos mais nova, começou a frequentar a sinagoga na Rua Augusta. Marcante, assim, foi a Segunda Guerra, aonde grande parte conseguiu chegar antes desta, e também a Revolução Húngara, quando vieram muitos húngaros”. Muitas atividades e eventos foram feitos, audições, cantores. Sra. Sara acompanhou ao piano o Chazan na realização do primeiro casamento realizado nesta sinagoga. Acabou casando com o filho do sr. Guttman, da CIP. Havia uma associação de mulheres que organizou a remessa de ajuda para a comunidade na Hungria. A mãe da sra. Suzana e Marion possuía uma empresa de moda, famosa, chamada Madame Boriska. O pai, sr. Julio Perl, foi um dos três Chazanim que cantava nos Shabatot e Grandes Festas, juntamente com sr. Emerich Neufeld e sr. Luiz Nebel. Serviços emocionantes e muito bonitos, como comenta sra. Suzana. Isto até falecerem. Todos lembraram que o Aron Hakodesh situava-se ao fundo do salão, sobre um palco/tablado elevado, que hoje não existe mais... Muitos casamentos ocorreram entre os frequentadores. Sra. Suzana sugeriu entrar em contato comTomaz Venetianer.

Roberto Strauss, arquiteto formado pela FAU em 1980, e húngaro desde 2013, frequentou a sinagoga em sua infância, na década de 1960, acompanhando o pai nas Grandes Festas. "A sinagoga ficava lotada, com pessoas inclusive do lado de fora. A grande maioria participava da sinagoga somente nestas ocasiões, falava-se muito, e o rabino a todo momento pedia silencio". Os quatro avós de Roberto vieram da Hungria. A família veio de Schopron, e Budapeste. O avô Reizfeld era médico da “colônia inteira”, porém não frequentou a sinagoga. Quando os avós e tios- avós eram vivos, na época da infância de Roberto, este não teve curiosidade em saber o motivo da vinda dos avós ao Brasil. Apesar do antissemitismo na Hungria, acredita que o motivo foi a busca de trabalho. Roberto estuda húngaro na USP.

Roberta informou que o Consulado Húngaro ofereceu ao Museu Judaico a oportunidade para organizar uma exposição sobre as Sinagogas Húngaras e do Leste Europeu, que será realizada na Universidade Mackenzie: a recuperação das sinagogas, a maioria na Hungria, mas também na República Tcheca e Polônia, a ser iniciada em 14 de maio. O governo húngaro tem um programa de preservação de sinagogas, transformando-os em museus, salas de concerto, bibliotecas e outros usos...

Andre Molnar não se lembra da Sinagoga da Rua General Osório, porém lembra-se de frequentar a Sinagoga da Rua Augusta. Chegou ao Brasil, aos cinco ou seis anos, com os pais, vindo da Hungria, não recebeu educação religiosa, mas fez Bar-Mitzvah nesta sinagoga, tendo tido aulas e aprendeu hebraico com Rabino Jolesz. O Bar Mitzva contou com muitos presentes...e Andre recorda-se que não conseguiu terminar o discurso... Frequentou esta sinagoga até 1975, quando casou-se com uma moça mais ortodoxa, passando a frequentar a sinagoga dos húngaros mais ortodoxos, nos Jardins: a “dos Citrons”, e o Beith Chinuch. Adré comenta: "Mas esta sinagoga da Rua Augusta foi muito marcante, e  sinto que é uma pena que não mais exista a participação, com mais frequência, da comunidade húngara, nesta sinagoga". Entende que é obvio que muitas coisas mudaram de lá para cá, mas percebe que pode ter havido falha da juventude. "Nas Grandes Festas todos vinham, mas ficavam de fora, em uma salinha, sentados às mesas, e dando voltas no quarteirão aguardando o final das rezas". Andre acredita que talvez haja uma volta, e depende de cada um presente neste encontro, depende de se organizarem, "pois cada um tem uma história...sr. Nebel, sr. Paulo Strausz, Neufeld, muitos outros. E há os que hoje em dia não querem nem se apresentar como judeus, que não viriam à sinagoga". Andre comenta que não era religioso, acompanhava o pai sr. Laszlo e sra. Ana Molnar, moravam perto, eram participantes, havia bailes. Os pais passaram a II Guerra escondendo-se na Hungria, em porões, e por parte de mãe e pai perdeu-se famílias, porém hoje voltou à religião, frequenta o Chabad, e mudou muito em relação ao que recebeu, de judaísmo... Uma sinagoga na Caio Prado, conduzida pelo Rabino Friedlander, foi aberta, e alguns frequentadores seguiram-no. O Rabino Jolesz após atuar nesta sinagoga, retornou a Israel.

Sr. Tomás Hajnal lembra bem da sinagoga, já está com mais de 80 anos, conta que sentava-se perto da grade para poder conversar com a mãe. O pai fez muitos shows de “conversas de surdos”, conversa entre dois amigos, onde um entendia errado o que o outro falava, muito cômico.  Na época separava-se homens e mulheres, as rezas eram em hebraico, os discursos em húngaro. O pai de sr. Tomás chamava-se Paulo e a mãe Margarida.

Andre lembra que em 1916, na Hungria houve uma lei em que o cidadão húngaro que tivesse qualquer sobrenome, não obrigatoriamente judaico, podia mudar para húngaro. O sobrenome de Andre é Molnar. Molnar é um sobrenome muito comum, e os avós optaram por este sobrenome. Era Maguenheim e mudaram para Monar. Isto dava uma certa tranquilidade, em termos. A Hungria foi um dos últimos países a entrar na II Guerra. Os avós foram mortos, juntamente com outras 36 pessoas, dois dias antes de a Guerra acabar. Dois tios, irmãos do pai, moraram na Italia. Um deles era professor de esgrima, o outro trabalhava com tecido. E conseguiram sair. E cita o livro Os Judeus do Vaticano. Saíram no ultimo navio, em 1939, da Italia.

O sobrenome de família do sr. Tomás era Leipnicker. Sr. Tomás conta que da Hungria, 700mil judeus foram mortos em Auschwitz. Uma lembrança tão marcante que as mães que aqui chegaram não quiseram ter mais filhos. Recorda-se do pai chorando ao saber do destino de todos em Auschwitz. Os pais de sr. Tomaz também saíram no ultimo navio que Mussolini liberou, em 1939.  

Ingrid Birta, cujo contato foi indicado por Inês Fenyves Sadalla, e que mora em Ubatuba (frequentam a Cojuba), conseguiu comparecer à visita juntamente com o filho Léo. Os avós Florea Farkas e Francisco Birta vieram da Romenia (porém de uma região originalmente da Hungria). Por tudo o que passaram, o trauma foi muito grande e acabaram não transmitindo as tradições judaicas, porém Ingrid e família resgatam neste momento o judaísmo, estudando e frequentando sinagoga.

Deste bate-papo, seguido de visita à sinagoga e um Lechaim, participaram Alan Kovari, Rabino Ivo Kauffman, Gabriela Rottgen, Rachel Mizrahi, Ingrid e Leo Birta, Anderson Rubin, Roberta Sundfeld, Roberto Strauss, Andre Molnar, Suzana Yara Guttman, Marion Kastscher, Tomás Hajnal, David Carlessi e eu, Myriam Szwarcbart.

Agradeço a todos os presentes e aguardem a próxima postagem com comentários, entre outros, de Paulo Valadares sobre a Chevra Kadisha Húngara.

Em breve, um próximo encontro

2 comentários:

  1. Parabéns Myriam Szwarcbart pelo maravilhoso trabalho, nós ficamos super felizes em visitar a Sinagoga e poder compartilhar nossa história com vocês. Se D'us permitir iremos ao próximo. Obrigada ao Rabino Ivo Kauffman que foi muito atencioso.
    Ingrid e Léo
    Guibirta@gmail.com

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    1. Obrigada, Ingrid pelo comentário!!! Amei que voces foram na visita e compartilharam a historia de voces!!! Beijos!!!

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