terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

Estrela de David em Sorocaba - por Israel Blajberg

A divulgação de dados, informações, memórias e histórias sobre as comunidades judaicas e suas sinagogas, tanto da cidade de São Paulo como do interior paulista permanece. Neste sentido compartilho também textos relacionados ao assunto, desde que autorizados pelos autores.

No final de 2020, sr. Israel Blajberg encaminhou um e-mail contando: 

“Sou carioca da gema, 75 anos, e nas minhas viagens sempre procuro conhecer as sinagogas e demais locais judaicos. De São Paulo, tenho uma recordação de Sorocaba, que envio ao final. Depois que estive em Sorocaba, li em algum lugar que os judeus oriundos de lá estavam promovendo alguma atividade. 

Gostaria de saber se conhece alguma família judaica de Poços de Caldas dos anos 1970. Estive lá com meus pais, e ele tinha amigos que moravam lá. Ou talvez fossem Landsman, ou parentes. Na época não dei muita importância, de modo que esqueci tudo, mas gostaria de recordar essa passagem...essa família de poços tinha uma fábrica de doces. São vagas recordações perdidas em algum canto da memória...

Muito grato, e parabéns pelo seu trabalho maravilhoso, gostei muito...” 

Sr. Israel autorizou compartilhar o texto sobre Sorocaba...Assim, segue o texto:

Estrela de David em Sorocaba

Israel Blajberg 

“Em nossas viagens, seja para Nova Iorque ou Pelotas, Buenos Aires ou Macapá, e tantas outras, sempre procuramos reservar um espaço para visitar locais judaicos. Em Sorocaba não foi diferente.  Ainda que não tivesse sido localizado nenhum contato, pudemos descobrir que Sorocaba também tem um passado judaico importante. Quem percorre o calçadão do centro de Sorocaba depara-se com um pequeno prédio, portas e janelas fechadas, paredes pichadas.  

Seria igual a tantos outros, não fosse um detalhe que logo identifica tratar-se de algo judaico.  No alto, uma estrela de 6 pontas ainda se destaca com sua pintura azul, resistindo ao tempo com a palavra Zion escrita em caracteres hebraicos. O azul da estrela destoa do estado geral de penúria, teimando em não esmaecer, não se deixar apagar, mantendo ainda suave tonalidade, como que a querer marcar aquele local com a santidade do seu simbolismo.

Era um final de tarde de sexta-feira, quando aproveitamos alguns momentos livres para localizar a antiga sede da SIBS - Sociedade Israelita Brasileira de Sorocaba. 

Por ser uma pequena rua lateral, este trecho do calçadão não é muito movimentado. Diante do prédio, detenho-me e procuro imaginar como poderiam ter sido alguns momentos assim há cinquenta, sessenta anos atras. Sorocaba teria talvez uma centena de famílias judaicas.

Algumas lojas do calçadão talvez estivessem baixando as portas um pouco mais cedo, face aos preparativos para o Cabalat Shabat. As portas da casa estariam abertas, as paredes pintadas, e quem passasse pela rua talvez se surpreendesse com um movimento diferente, de pessoas em suas melhores roupas, mulheres de chale, homens de kipá, talvez pudessem até entreouvir cânticos vindos do interior daquela casa.

Mas logo desperto das minhas divagações, caindo na realidade.  Como tantas outras no Brasil, Sorocaba já não possui mais uma comunidade judaica minimamente organizada. Assim parece ser a tendencia em pequenas cidades. O judaísmo no nosso modelo prevalente, nas últimas décadas tendeu a se concentrar em alguns polos, com certas exceções. Não é a teia pulverizada de shtetales (cidadezinhas) que existiu em países da Europa Oriental, e hoje ainda se verifica, com outras características, nos EUA.

Entretanto, existe uma memória judaica relevante, e que ainda se manifesta fortemente em Sorocaba. 

Estamos falando de Luiz Matheus Maylasky, judeu hungaro, fundador e construtor da EFS - Estrada de Ferro Sorocabana, que veio a receber de Portugal o título nobiliárquico de Visconde de Sapucahy, conforme nos ensinou em suas obras o saudoso casal de historiadores dos judeus do Brasil, Egon Wolff (1910-1981) e Frieda Wolff (1912-2008).

Não muito distante da sede da SIBS no calçadão, diante do Museu da EFS, uma estátua de Maylasky o representa ao lado de um trabalhador que empunha uma picareta. 

Olhar firme, pergaminho na mão, o braço levantado aponta para a frente como que indicando o caminho a seguir para construir a ferrovia, que presidiu de 1870 a 1875, passando depois o controle para o grupo inglês de Percyval Farhquar, o lendário construtor da Madeira-Mamoré, e que anos depois foi encampado pela FEPASA, hoje subsistindo o transporte de carga pela ALL.

Há mais de 30 anos o trem de passageiros já não adentra mais a bela estação de Sorocaba, menor, mas no mesmo estilo da Julio Prestes em São Paulo, próximo ao Bom Retiro.

O Museu abriga entre tantas peças da ferrovia, diversos objetos pessoais de Maylasky, destacando-se o florete que a ele pertenceu, na qualidade de oficial do Exército Imperial austro-húngaro. Os judeus formavam em grandes números naquelas tropas, como se pode avaliar visitando o cemitério judaico de Vienna, onde uma seção foi especialmente dedicada aos que tombaram na 1ª. Guerra Mundial, servindo de cemitério militar com monumentos e mausoléus. Mais de 40 coronéis, generais e almirantes judeus lá estão sepultados.

Os da geração de imigrantes, que palmilharam as ruas de Sorocaba, já não estão mais aqui. Mas alguns de seus nomes ainda podem ser consultados na página da Internet da SBIS, onde verificamos uma observação esclarecedora: Atividades temporariamente encerradas. Por falta de recursos a Sibs fechou o escritório em Sorocaba.

Os judeus partiram, deixando a marca da sua contribuição, onde certamente se destaca Maylasky, ainda que provavelmente não muitos sorocabanos possam identificar sua origem.  Mas podem se orgulhar muito dele.”

Vocês gostariam de ter as suas histórias, ou de suas famílias, publicadas neste Blog? Memórias relacionadas às sinagogas que frequentaram ou que ainda frequentam, ou relacionadas às comunidades judaicas a que pertencem, resgatando suas raízes? Escrevam um texto e encaminhem para myrirs@hotmail.com

Vamos divulgar e buscar preservar nosso rico patrimônio histórico e cultural, seja ele material ou imaterial? Compartilhem lembranças, enviem fatos, fotos, documentos, lembranças. Vamos participar deste estudo que realizo, e também do levantamento arquitetônico e artístico das sinagogas, seus objetos e mobiliário, a fim de preservar, revitalizar e reutilizar estas edificações?!

Obs: As fotos foram enviadas por sr. Israel Blajberg. Para compartilhar, contatem-no e solicitem autorização...

2 comentários:

  1. Há uma informação absolutamente fantasiosa neste texto: a de que Maylasky teria recebido o título de Marquês de Sapucahy. O verdadeiro era Cândido José de Araujo Viana, católico dos quatro costados e com título nobiliárquico recebido de D. Pedro II.

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    1. Boa tarde Victor. Obrigada pelo comentário, porém o texto não cita que Maylasky recebeu o título de Marques de Sapucahy, e sim de Visconde. "..que veio a receber de Portugal o título nobiliárquico de Visconde de Sapucahy, conforme nos ensinou em suas obras o saudoso casal de historiadores dos judeus do Brasil, Egon Wolff (1910-1981) e Frieda Wolff (1912-2008)". Esta referência também é citada na Wikipédia: "Adquiriu os títulos de Fidalgo cavaleiro da Casa Real e visconde por decreto real de 29 de maio de 1891 do rei Dom Carlos I de Portugal".

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